(Por PaTTi Cruz)
Esta história começa com um
nariz. Porque é ele que chega primeiro à página do livro. Um nariz longo e
fininho. Não fosse assim tão longo, poderia ser o bico de um beija-flor. Logo
atrás dele, olhos e boca não negam, é mesmo humano.
Mas, o nariz chega à página
com uma gota bem molhada na ponta. É uma lágrima que conta da tristeza de seu
dono: Joel. Que é alvo das maldades e ironias por causa, justamente, do tamanho
do nariz.
Na página ao lado, sua
vizinha quase não tem espaço para uma letrinha. É por causa de Anabel que é
grandona e ocupa assim, logo duas folhas. Anabel parece aborrecida com os
gracejos que ouve por conta de seu tamanho.
Na página seguinte mora
Mário que aqui ninguém vai ver, pois é tão alto, o garoto, que faltou folha
para cima, só deixando aparecer da cintura até seus pés. Deve estar gritando
fora da página, incomodado com a situação, pois todos o chamam de “esticadão”.
Na página quatro tem Andila
é suave e pequenina. Fica quase no fim da folha, não precisa mais do que isso
para acomodar-se, pouco papel é suficiente. Mas, sofre também a menina, com as
risadas e piadinhas por tão pequenininha.
Um dia de tantas e tantas páginas
percorrerem, tentando se esconder dos olhares insensíveis caíram todos, ao
mesmo tempo, em uma folha toda verdinha. Parecia relva! Então, depois da queda
e do susto, resolveram sentar-se. Foi neste momento em que todos se olharam.
Viram tantas diferenças que não estavam nem acreditando. Tem mais gente
diferente e eu aqui chorando!! Disse Joel, já recolhendo outra gota da ponta do
nariz.
O que eles não sabiam é que
na página verdinha, morava um Mago, que se chamava, Mago mesmo. Ele era baixo,
de barbas longas, um olho de cada cor, falava quase sussurrando, sempre sorrindo.
Mas, era estranho o Mago que morava neste lugar.
Atrás dele, feita de folhas
e galhos secos, havia uma casa. Casa de mago, destas bem misteriosas. Cheirava
a capim e flores, tinha uma mesa de madeira, e os bancos eram de pedra. Era
tudo muito simples, mas bonito também. O Mago convidou-os para sentar e tomar
um caldo que recém tinha fervido. O gosto era bom, mas curiosos se olharam,
pois não sabiam do que era feito! Com certeza, devia ser uma receita secreta.
Nada perguntaram ao Mago e
continuaram sorvendo o caldo....
Fizeram a refeição e em meio
a conversas, todos contaram suas histórias e tristezas, por causa de suas
aparências. Pediram ao Mago um feitiço! Uma solução! Mago olhou para cada um e
circulou o olhar pela cabana a sua volta...pega logo um espelho e mostra para o
grupo, dizendo: Este é um espelho especial, que nunca ninguém viu um igual. Não
era um espelho que tivesse para vender em qualquer lugar, não adiantava nem
procurar.
Quiseram saber sobre a
história do espelho, que parecia tão fantástica. Mago conta aos meninos que
gostava muito de conversar com todos os seres que habitavam a floresta, animais
e plantas e outros mais que pudessem existir e aparecessem a sua frente. Disse
a eles que todos estes seres, sem exceção, eram muito diferentes entre si e
tinham características muito especiais e que a existência de cada um tinha uma
finalidade de ser. Mago acreditava que não era em vão que eles faziam parte da
natureza.
Falou do Sapo Largo do rio,
que uma vez encontrou chorando em cima de uma pedra. O Sapo estava triste por
que achava-se mais largo do que os outros de sua espécie e bem na hora que o
Mago chega surge um grupo de rãzinhas querendo atravessar com pressa o rio,
pois tinham um compromisso do outro lado da margem. Acreditavam que nunca
chegariam a seus destinos. Eram ainda pequeninas e não tinham a destreza de
nadar rápido. Queriam chegar todas juntinhas e, eram doze menininhas! O Sapo
que era largo achou que poderia ajudar. Pediu as meninas que subissem em suas
costas de sapo. Todas conseguiram se acomodar e, felizes, junto com o largo
Sapo, puderam o rio atravessar. Assim, deste dia em diante, a margem do rio é a
morada do Sapo, que teve seu nome acrescido da largura de sua bondade, passando
a ser conhecido como o Sapo Largo do rio.
Falou também do pequeno
Arién, um pássaro minúsculo que morava no interior do tronco da goiabeira.
Tinha uma casa singela e um sorriso triste na ponta do bico. Mago conta que em
uma noite quente, sentiu uma enorme vontade de comer goiaba e foi à floresta ver
se encontrava. Chegando à goiabeira, estendeu o braço em direção a ponta do
galho que sustentava uma goiaba bem suculenta e em seguida ouviu um solucinho e
um chorinho, parecendo ser de um passarinho. E era mesmo!! O pequenino vendo
que tinha visita, olha pela fresta da sua casa. Mago, com ternura diz para
Arién que não sofra. O pequeno pássaro fala de seus outros amigos que são
maiores e mais robustos, tem vôos belos e encantam o céu. Mago pede que ele
deite e adormeça e que quando acordar no dia seguinte terá uma linda surpresa e
saberá por que foi presenteado com este tamanho.
Passada a noite, à luz do
sol chega. Arién desperta e encontra na floresta uma manhã especial. Naquele
dia, ainda não sabia por que, sentia-se feliz e de certa forma mais confiante.
Ao espreguiçar-se estica suas patinhas, sacode a cabeça, move seu pescoço e
finalmente abre as asas e leva um susto! Percebe em si asas enormes que nunca
antes tinha visto. Será que nunca havia se espreguiçado assim? Pensa Arién...
Corre para fora do tronco e
abre suas asas imensas, voa para todos os lados, para o alto e de volta para
baixo, percorre todas as árvores e flores em uma velocidade gigante! Vai a
cabana do Mago em um segundo, contando a novidade. Mago, que era Mago, como
todos sabem, apenas sorri, pois sabia já do fato, antes mesmo de existir. Diz
ao pequeno que saberá em alguns dias de sua valiosa tarefa.
Passado um dia e um
pouquinho, Arién o pequenininho vê muitas outras flores espalhadas na floresta,
que nunca vira antes. Tinham pequenas e tinham grandes! De todas as cores e
perfumes! Todas elas lhe sorriam e agradeciam com as pétalas a vida que ele lhes
dera. Arién Vivaz, como passou a ser chamado, tinha descoberto sua tarefa,
levar em suas grandes asas e vôos rápidos, muito mais pólens e sementes pela
floresta e assim, criar novas cores e vidas todos os dias, por onde passasse.
Mago contou a história de
Lisbela Acabrunhada, que chamou-se assim só por algum tempo. Era uma lagarta
que se transformara numa linda borboleta. Contava ele, que Lisbela, não fora
sempre bela...ela viveu por algum tempo
muito fechadinha e acabrunhada, numa pequena casa. Casca, casa - casa de casa.
Não se sabe bem! Sabiam apenas que era por isso que tinha esse nome. Ali
dentro, reservada, na sua aparência ainda estranha, aos olhos de alguns,
permanecia bem quieta, não falava com ninguém. Parecia estar certa de que
esperava pelo tempo em que “tudo” iria acontecer. E foi assim! Todos que
passavam, olhavam aquele enroladinho preso num cantinho do galho do Carvalho.
Alguns cutucavam e Lisbela fica muito chateada. Os dias na floresta seguiam,
com sua vida tranqüila e colorida. Foi em uma tarde perfeita de sol, que sem
que ao menos esperassem, os seres que habitavam a floresta e estavam em volta,
viram uma das maravilhas mais, mais, mais...maravilhosas do mundo! Num romper
de casca-casa vai surgindo uma beleza nunca vista...era ela a Lisbela que vinha
para um diferente despertar. Seus olhinhos curiosos examinavam tudo e todos. E
o mais impressionante foi quando as cores contrastantes de asas que se abriam
começaram a aparecer. Lisbela flor em borboleta, desabrochava sua vida, para
pequena e colorida a floresta enaltecer! E foi assim que Lisbela Bela, deixou a
acabrunhada vida de lado, mostrando a todos que ali estavam, de boca aberta
parados, que tudo tem um tempo para acontecer!
Com estas três histórias que
ouviram os meninos ficaram encantados, mas queriam saber sobre o espelho que o
Mago tinha na mão. Então, numa só sacudidela, o espelho que parecia pequeno,
vai tomando outra forma. Transforma-se em uma capa, bem larga e toda espelhada.
Mago a veste e pede que se aproximem, um de cada vez e diz que esta capa lhes
mostrará os reflexos da verdade.
Joel é o primeiro que vai
pertinho da capa do Mago. Quando Mago lhe pergunta o que vê na sua capa, o
menino responde, vejo ainda só o meu nariz....Parecia desiludido, pois tinha a
esperança de uma solução. O Mago, então com sua natural paciência, bondade e
voz sussurrante, explica que a capa espelhada mostra os seres por inteiro e não
só uma parte. E que, portanto, não pode apenas estar vendo um nariz que invade.
Pede que observe bem, de olhos abertos e a mente livre de outras imagens que
ele já tivesse construído. E assim Joel, fez. Encantado com o que via, Joel
chorava e sorria. Não viu apenas o seu nariz, mas viu seus olhos, sua boca, seu
rosto todo e assim seu corpo, viu por fora e viu por dentro, sua cabeça e seu
peito. Viu seu coração que batia feliz e que era cheio de coisas boas e a sua
mente que tinha idéias. Então Joel entendeu que ele era muito mais, muito mais
do que sua aparência e que ela na verdade fazia parte das diferenças! Assim,
como todos naquela floresta, ele tinha uma vida e uma tarefa. Talvez
descobrisse mais tarde, mas agora, queria apenas ser feliz com seu nariz!
Depois de Joel foi Anabel
que chegou e logo na primeira olhadela viu uma bela borboleta amarela. Não, ela
não seria daqui uns dias uma borboleta como Lisbela, mas entendeu que o tempo
poderia lhe mostrar coisas novas a serem descobertas e que a vida lhe fazia uma
oferta, de ser feliz e ser liberta.
Mário chega perto, mas não
muito certo de que pudesse se ver. Pensava que faltaria capa para mostra-lhe o que
de fato viria a ser. Surpreende-se quando enfim olha, seu corpo inteiro e muito
mais. Vê no espelho da capa um belo menino com um lindo destino.
E chega Andila sorridente,
só assim já estava contente via que todos estavam felizes pelo que encontraram em
seus reflexos. A pequena e doce menina chega bem pertinho de um pedacinho, mas
o que vê é uma imagem de tamanha grandeza e imensa beleza. Sua pequena estatura
era só um recanto, aconchegando o que de fato dentro guardava. Percebeu que era
sua gigantesca existência que mostrava sua encantadora essência.
Mago fala mais um pouco
sobre a vida de cada ser e que é preciso olhar com cuidado para tudo perceber.
Não basta olhar em volta ou pela superfície, tem que ir mais fundo na
existência, porque se aqui estamos é por que precisamos compreender a nossa
essência. E foi assim que Mago, que não era Mago em vão, deu a cada um, um
pedaço da capa espelhada. Olharam bem o pequeno tecido que Mago ofertava. Mago,
explica logo em seguida que o pedaço pode ser pequeno, mas, o valor da
descoberta é que anuncia o verdadeiro tamanho.
Aquele pano de espelho, espelha vida e serve para os momentos em que é
preciso que encontremos de novo com o nosso ser, aquele que todos temos, mas às
vezes teima em se esconder.
E Mago avisa aos visitantes
que agora terão que ir para os seus destinos poderem cumprir. Achando que àquele
local pertenciam, se olharam intrigados. E Mago os coloca em uma outra página
do livro dizendo que suas tarefas não eram fáceis mas essenciais para aquele
lugar para onde estavam indo.
Sentido-se honrados e
orgulhosos por terem compreendido sobre suas diferenças foram para um lugar,
onde muitas outras diferenças encontrariam. Aquela página tinha uma esfera de
cores vibrantes, azul, verde, marrom. Não pensaram duas vezes e mergulharam fundo.
Descobriram que este lugar que encontraram se chamava Mundo.
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